quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Despi-me e dispus-me

à essência;
ao por vir;
aos pormenores
maiores



"se deixou levar por sua convicção de que os seres humanos não nascem para sempre no dia em que as mães os dão à luz, e sim que a vida os obriga outra vez e muitas vezes a se parirem a si mesmos."
(Gabriel García Marquez em 'O amor nos tempos do cólera')

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Compasso



É só começar, vai. As coisas vão tomando forma quando você busca manter um olhar aguçado para o sol as 6h da manhã, sem reclamações desprezíveis. Acredite: desprezíveis. Está fragmentado, eu sei. O receio, o gesto, o quase bom-dia, a reza, o que te mantém de pé. Mas espero que após juntar todos esses pedacinhos, um em cada compartimento do que você chama de moradia, tenhas um coração completo. Sim, completo, depois de filtrado. Com cores e formas, pronto para viver o que acontecerá agora, daqui há um minuto que já se foi. Pronto para dá o primeiro passo, o segundo e assim por diante, depois de tantos já ultrapassados. Saiba: você não é o único nisso.
Grito. Tenho direito à voz. Tenho direito à vez. Ainda que meu grito seja silenciado pelas buzinas e minha vez seja perdida por alguém que furou a fila. Aprendi que paciência é a chave de uma respiração aliviada quando o ar está pesado. Tanta coisa já não me cabe dentro, aliás, nunca couberam. Acredito que na procura de um espelho, encontrei vidraças velhas que mostraram friamente, de fato, meu reflexo. Em cortes. Recortes de feridas e idas, outras voltas. Hoje, dançando em outros compassos. Num passo de cada vez.
O que não cessa está do lado de cá. Do lado de uma postura que dispensa formalidades baratas que só cabem na "burguesia decadente", como diria Edu, nas escrituras do querido amigo Caio Fernando.
Para mim não importam em quantos pedaços as coisas se fragmentam, o que prende mais minha atenção é o que fará com que todas essas partes se juntem novamente. A força capaz de transformá-las em pequenos universos, agregando tudo o que tem amor na composição e jogando fora as utopias que não cabem num coração de criança.
Junta tudo o que te cabe. Desarme-se do que é faz de conta.
Hoje escolhi ser assim, escrever desse jeito, silenciar naquela hora que foi difícil engolir a prosa-presa e chorar quando digo que não tenho motivo para isso. Mas mesmo com um coração bobo e desajeitado, não quero mais fingir que não o escuto. Foi-se o tempo.
E por falar em tempo, o calendário ainda diz ser primavera...Sei que quando esses dias terminarem, meu estoque de tulipas-margaridas-lírios-e-bem-me-quer, estará pronto pra suportar qualquer gota cristalizada por causa do frio, vindo de dentro.
Avanço. Mesmo que às vezes fique perdida no pensamento de saber se no próximo passo vou alçar vôo ou machucar as asas.
Avanço. Mesmo afirmando que às vezes não conseguirei dar conta disso. E quando esse tipo de ideia vem ao meu encontro é quando caio em mim e sinto que hoje eu sei o que seguir. Na contradição de: ainda que indo sem saber para onde.
Pronta para ver o sol raiar.

Raiou ,

sábado, 8 de outubro de 2011

Burilando

Burilar: Fig. Trabalhar qualquer coisa com cuidado; [re]tocar.

" E ela mesma resolveu escolher tomar este caminho de cá, louco e longo e não o outro, encurtoso." (João Guimarães Rosa)


A tensão no mundo concreto não balança as folhas da laranjeira em meu quintal. Elas são bonitas mas não são bobas não. Dançam pro vento e lá se vai perfume a quem quiser...Balançam quando algumas folhas avisam que vão embora, porque é chegada a hora. De renascer. Todas elas, as que ficam e as que vão, sabem das razões para retribuir a gentileza do sol e da chuva [revelando crescimento]. Entre ambos: arco-íris. Pra não esquecer do meio, sabe. Do antes de. Do quase lá. Aos pouquinhos, certezas benfeitoras agarram-se nas raízes de um solo fértil, mais que útil. E mostra que raíz não vem como prisão, mas sustento do que nasceu quando você menos esperou e do que há de vir. Aprendi a pisar no chão descalça pra sentir areia entre os dedos, mas aprendi também a não limitar meus olhos com material corrompido.
Vai tão mais longe.. É tão mais perto..
Céu azul, sem dúvida, é um bom amigo da laranjeira no quintal de dentro de mim. De dentro de nós.